17 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Partes
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Apelação Cível nº 2018.007973-2
Origem : 4ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Natal/RN.
Apelante : Município de Natal.
Advogado : Victor Hugo Holanda Chaves e Jorge Luiz de Araújo Galvão.
Apelado : Francisco Werton Diógenes.
Advogado : Rodrigo Yacyszyn Alves Romão e Vanildo Cunha Fausto de Medeiros.
Relator : Desembargador Dilermando Mota.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. TETO REMUNERATÓRIO. ART. 37, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NORMA CONSTITUCIONAL DE EFICÁCIA PLENA. AUTO-APLICABILIDADE SEGUNDO POSIÇÃO DO STF EM REPERCUSSÃO GERAL: RE 609.381/GO, JULGADO EM 02.10.2014. DESNECESSIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. NÃO VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO ADQUIRIDO E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. NORMA AUTOAPLICÁVEL. SENTENÇA REFORMADA PARA JULGAR TOTALMENTE IMPROCEDENTE OS PEDIDOS DA INICIAL.. APELO CONHECIDO E PROVIDO.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em turma, por unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível pelo Município de Natal/RN em face de sentença proferida pelo (a) Juiz de Direito da 4ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Natal, que, nos autos do Ação Com Procedimento Ordinário nº XXXXX20128200001, proposto por Francisco Werton Diógenes, julgou parcialmente procedente a sentença nos seguintes termos:
"Julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido autoral para, confirmando a tutela concedida de maneira antecipada, determinar que o réu se abstenha de efetuar desconto no vencimento do autor, com vista à adequação ao teto constitucional, sem que antes se observe o devido processo legal administrativo."
Nas razões de fls. 09/12, aduz a apelante, que é desnecessário o processo administrativo para aplicação do teto remuneratório.
Argumenta que a norma do teto remuneratório é autoaplicável, não havendo que se falar em procedimento administrativo prévio para cada situação.
Juntou precedente deste Egrégio Tribunal de Justiça e do STF.
Sem contrarrazões.
Instado a se pronunciar, o Ministério Público, por intermédio da 6ª Procuradora de Justiça, deixou de opinar sobre o feito (fls. 18).
É o relatório.
VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se a irreginação recursal a respeito da possibilidade do ente público apelante, reduzir os vencimentos do apelado ao teto constitucional, sem oportunizar o contraditório e ampla defesa em processo administrativo.
Sobre o tema, a constituição Federal de 1988 fixou, em seu art. 37, XI, o chamado teto remuneratório, ou seja, o valor máximo que os agentes públicos podem receber no país, abrangendo todas as espécies remuneratórias e todas as parcelas integrantes do valor total percebido, incluídas as vantagens pessoais ou quaisquer outras.
Registro que o Supremo Tribunal Federal, no exame do RE 609.381/GO, Relator o Ministro Teori Zavascki, julgado em 02.10.2014, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 480), assentou que o teto estabelecido pela EC 41/2003 é de eficácia imediata e todas as verbas de natureza remuneratória recebidas pelos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios devem se submeter a ele, ainda que adquiridas de acordo com regime legal anterior.
Desta feita, a garantia da irredutibilidade de remuneração não impede a aplicação imediata do teto de retribuição. Isso porque o próprio texto constitucional, ao tratar sobre o princípio da irredutibilidade, ressalva expressamente o inciso XI do art. 37, deixando claro que é possível a redução da remuneração/proventos para aplicação do teto de retribuição. Nesse sentido, nesse sentido são os art. 37, XV, art. 95, III e art. 128, § 5º, I, c.
Assim, o pagamento de remunerações superiores aos tetos de retribuição, além de se contrapor aos princípios da moralidade, da transparência e da austeridade na administração dos gastos com custeio, representa gravíssima quebra da coerência hierárquica essencial à organização do serviço público.
No julgamento da AC 2014.007165-5 (julgado em 11.09.2014) e do RN 2015.017295-0 (julgado em 01.03.2016), processos de relatoria do Desembargador João Rebouças, o TJRN considerou que "ainda que a lei de regência e a jurisprudência assegurem a possibilidade do Estado reaver as verbas pagas indevidamente aos servidores mediante desconto na folha de pagamento, o certo é que tal conduta imprescinde da garantia, ao interessado, do devido processo legal administrativo, do qual são informadores os princípios do contraditório e da ampla defesa, cuja amplitude constitucional (art. 5º, LV /CF) não comporta afastamento, a não ser na supressão do chamado abate-teto."
Desta forma, como bem firmado na tese do STF, não se pode invocar a violação do direito adquirido ou ato jurídico perfeito para excepcionar a imposição do teto de retribuição, pois a remuneração percebida pelo apelado não estão em conformidade com a Constituição Federal de 1988.
Ademais, havendo previsão constitucional expressa para que haja adequação dos salários aos tetos nela estabelecidos, desnecessária e inócua seria instauração de procedimento administrativo, não sendo tal fato violador dos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal.
De acordo com posição também adotada pela Segunda Câmara Cível do TJRN, como não há imposição de qualquer penalidade, bem assim a supressão de quaisquer direitos, é desnecessária a instauração do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa quando se está diante de aplicação do teto constitucional. Entende-se que a limitação ao teto remuneratório é decorrência natural da norma constitucional, sendo legítimo, portanto, o exercício da autotutela e desnecessária a instauração de processo administrativo para que se proceda o corte do que estiver acima do previsto no art. 37, XI, CF/88 (AI 2014.024376-8, Relator Desembargador Ibanez Monteiro, julgado em 27.01.2015; AC 2011.015784-6, Relator Desembargador Ibanez Monteiro, julgado em 11.11.2014). Eis a ementa do AI 2014.024376-8 em que se destaca a desnecessidade de processo administrativo para a aplicação da norma constitucional que determina a incidência do teto remuneratório:
"EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TETO REMUNERATÓRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 41/2003. AUTO-APLICABILIDADE. NÃO NECESSÁRIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. VANTAGEM PESSOAL. INCLUSÃO NO CÁLCULO DE TETO REMUNERATÓRIO. NÃO VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO ADQUIRIDO E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO."
O entendimento acima ganha reforço diante do comando do artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórios (ADCT) que prevê a supressão imediata de toda remuneração/subsídio/vantagem/adicional recebida acima do teto constitucional. Eis o dispositivo mencionado:
"Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título."
Ante o exposto conheço e dou provimento ao recurso, a fim de reformar sentença recorrida julgando totalmente improcedente a pretensão autoral.
Custas judiciais e Honorários sucumbenciais a serem pagos pelo autor.
É como voto.
Natal, 30 de abril de 2019.
Desembargador Dilermando Mota
Presidente/Relator